A promulgação da Lei nº 13.709/2018, conhecida como Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), marcou uma mudança importante na proteção da privacidade no Brasil. Embora tenha sido criada principalmente para regular o uso de dados no ambiente digital e comercial, a LGPD rapidamente demonstrou efeitos relevantes também no contexto das relações de trabalho, já que, durante toda a vida do contrato, empresas lidam com uma grande quantidade de informações pessoais dos trabalhadores.
A proteção de dados passou a ser necessária em todas as etapas do vínculo empregatício. Antes mesmo da contratação, já ocorre a coleta de informações como currículos e referências. Durante a vigência do contrato, são tratados dados bancários, documentos pessoais, informações sobre saúde, vínculos sindicais, entre outros. E, mesmo após o encerramento do contrato, diversos documentos precisam ser mantidos para cumprir obrigações legais e fiscais. Por isso, a LGPD se aplica a toda a jornada do trabalhador na empresa, e é fundamental que os cuidados com essas informações sejam contínuos.
Diante disso, as empresas precisaram revisar práticas internas e adotar medidas para garantir o uso adequado dos dados dos empregados. Isso envolve cuidados na coleta, armazenamento, compartilhamento e descarte das informações, sempre respeitando critérios como necessidade, finalidade e segurança. Além disso, a LGPD trouxe reflexos para a Justiça do Trabalho, que passou a lidar com processos envolvendo vazamento indevido de informações e uso irregular de dados pessoais dentro do ambiente de trabalho.
Nesse contexto, é papel do empregador criar políticas claras sobre o uso de dados pessoais, revisar contratos, treinar suas equipes e adotar procedimentos que garantam segurança e proteção aos dados tratados no dia a dia. Já os empregados, por sua vez, também têm responsabilidade em proteger as informações pessoais às quais têm acesso durante suas atividades, seguindo as orientações da empresa e contribuindo para uma cultura de respeito à privacidade.
Atividades simples, que antes passavam despercebidas, hoje precisam ser analisadas com atenção. É o caso da divulgação de listas internas, do envio de informações para operadoras de planos de saúde, do cadastro em programas de benefícios e até do armazenamento de documentos pessoais. Tudo isso deve ser feito de forma segura, transparente e com uma justificativa clara para o uso dessas informações.
Os impactos da LGPD também chegaram à Justiça do Trabalho. Em processos trabalhistas, por exemplo, informações pessoais dos envolvidos costumam ser apresentadas como provas. Nesses casos, é necessário cuidado redobrado para garantir que a privacidade seja respeitada, evitando a exposição desnecessária de dados sensíveis durante o andamento dos processos.
Outro ponto relevante diz respeito às negociações coletivas e à atuação dos sindicatos. Embora sejam importantes para organizar e defender interesses dos trabalhadores, os acordos e convenções coletivas não podem autorizar práticas que desrespeitem a proteção de dados pessoais. Mesmo quando há previsão para o compartilhamento de informações dos empregados com terceiros, como para viabilizar benefícios, é preciso que essas ações sigam as exigências da LGPD e não coloquem em risco a privacidade dos trabalhadores.
Tudo isso reforça que a proteção de dados passou a ser parte essencial das relações de trabalho. Mais do que uma exigência burocrática, garantir a privacidade e o controle das informações pessoais dos empregados é uma forma de respeitar a dignidade de quem trabalha. As empresas, sindicatos e profissionais da área jurídica precisam se adaptar e tratar o tema com a seriedade necessária, não apenas para cumprir a lei, mas para proteger um direito fundamental.
Mais do que ajustes em documentos e processos internos, é necessária uma mudança de mentalidade. Respeitar os dados pessoais dos trabalhadores é garantir que cada pessoa tenha segurança e tranquilidade em relação às informações que compartilha com a empresa. Do processo seletivo ao encerramento do contrato, passando por negociações coletivas e até por processos judiciais, a proteção de dados precisa estar presente como parte fundamental das relações de trabalho.
O grande desafio das empresas, sindicatos e profissionais do Direito não é apenas cumprir a legislação, mas fazer da proteção de dados um valor presente na cultura organizacional, garantindo que a privacidade seja um compromisso inegociável em qualquer cenário.
Por Gabriel Fernandes Braga Jorge,
sob supervisão do Coordenador da Área Trabalhista – Dr. Fernando Ribeiro da Silva