Progressividade da alíquota de ITCD e a legislação mineira.

O princípio da capacidade contributiva, premissa básica da normatização constitucional da tributação brasileira, sempre foi relevado por muitos Estados na fixação das alíquotas de ITCMD, pois a Constituição Federal não tinha previsão expressa determinando a observância da progressividade do imposto.

Somente em 2013, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema de Repercussão Geral nº 226, consolidou o entendimento de que o ITCMD era compatível com a progressividade de alíquotas. Esta decisão representou marco fundamental na interpretação constitucional do tributo, autorizando os estados a implementarem sistemas progressivos de tributação. A partir dessa orientação jurisprudencial, a maioria dos entes federativos ajustou suas legislações, implementando alíquotas crescentes até o limite máximo de 8% estabelecido pela Resolução do Senado nº 9/92.

O Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), pago em heranças e doações, passou por uma transformação importante com a Emenda Constitucional nº 132/23. A partir de dezembro de 2023, tornou-se obrigatório que todos os estados apliquem alíquotas progressivas, ou seja, quanto maior o valor recebido, maior a taxa de imposto.

Até 2023, os estados tinham liberdade para escolher entre alíquotas únicas (mesmo percentual para qualquer valor) ou progressivas. Estados como São Paulo (4%), Minas Gerais (5%), Paraná (4%) e Mato Grosso do Sul (6%) optaram por manter alíquotas fixas. Com a mudança constitucional, a Constituição Federal agora exige que todos os estados adotem alíquotas progressivas, podendo variar de valores menores até o limite máximo de 8%. Isso significa que heranças e doações de menor valor pagarão percentuais menores, patrimônios maiores pagarão alíquotas mais altas, e a cobrança deve respeitar a capacidade contributiva de cada pessoa.

Quase dois anos após a promulgação da emenda, vários estados ainda não ajustaram suas leis. São Paulo apresentou projeto de lei estabelecendo progressividade de 2% a 8%, mas a tramitação está parada desde março de 2024. Minas Gerais ainda não possui sequer um projeto de lei para implementar a progressividade. Outros estados enfrentam situação similar de inércia legislativa.

A manutenção de alíquotas únicas após a EC 132/23 gera uma situação de inconstitucionalidade. As leis estaduais que não respeitam a progressividade obrigatória estão em desacordo com a Constituição Federal, tornando questionável a cobrança do imposto nos moldes atuais. Isso significa que a exigência do ITCMD baseada em legislações que não preveem progressividade pode ser considerada cobrança inconstitucional.

A tributação progressiva sobre heranças e doações promove justiça social, fazendo com que quem recebe mais contribua proporcionalmente mais, reduz desigualdades evitando concentração excessiva de riqueza, segue padrões internacionais adotados por países desenvolvidos e respeita a capacidade contributiva, princípio fundamental do direito tributário.

Enquanto alguns estados não se adequarem à nova regra, existem estratégias legais para otimizar a transmissão de patrimônio. A primeira é realizar doações antecipadas ainda sob as regras atuais (alíquota única) antes da implementação da progressividade. Em Minas Gerais, por exemplo, ainda se aplica a alíquota linear de 5%. Também é possível dividir o patrimônio em doações menores ao longo do tempo, pois isso pode resultar em enquadramento em faixas de alíquotas inferiores.

A constituição de uma empresa familiar (holding familiar) permite transmissão gradual de quotas sociais, redução de custos de inventário, maior controle sobre a sucessão e gestão profissional do patrimônio. Combinar testamento com doações mantendo usufruto vitalício permite organizar a sucessão sem perder o controle dos bens durante a vida.

Contratar seguros de vida e planos de previdência privada pode ser vantajoso, pois muitos estados não tributam esses valores com ITCMD, proporcionando liquidez imediata aos beneficiários. Além disso, manter documentação atualizada, incluindo registros imobiliários, societários e fiscais, evita reavaliações prejudiciais durante doações ou inventários.

Para quem possui patrimônio significativo, é importante agir rapidamente, pois a progressividade é questão de tempo em todos os estados. É fundamental buscar orientação profissional, já que cada situação requer análise específica de custo-benefício. Vale considerar doações antecipadas para aproveitar as alíquotas atuais antes das mudanças e organizar a documentação para evitar complicações futuras.

A obrigatoriedade de progressividade no ITCMD representa avanço importante na direção de um sistema tributário mais justo e equitativo. Embora alguns estados ainda não tenham se adequado à nova regra constitucional, é apenas questão de tempo até que todos implementem alíquotas progressivas.

Para proprietários de patrimônios significativos, o momento é de planejamento. Antecipar estratégias sucessórias adequadas pode representar economia tributária expressiva, sempre com análise cuidadosa de cada situação específica. A mudança constitucional reflete a evolução do direito tributário brasileiro em direção a maior justiça fiscal, garantindo que a transmissão de patrimônio contribua adequadamente para a redução das desigualdades sociais conforme determina nossa Constituição Federal.

É fundamental buscar orientação jurídica especializada para avaliar a melhor estratégia para cada situação patrimonial específica, considerando os aspectos tributários, familiares e sucessórios envolvidos.

Por Dr. Leonardo Barcelos Silva, Consultor Jurídico e Advogado da Área Cível da Gontijo Mendes Advogados Associados.

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